A fileira do leite e o QREN

Maltratada, esquecida, ignorada, muitas vezes vilipendiada, a agricultura portuguesa tem de ser um dos pilares fundamentais da nossa actividade económica, como ainda se recentemente provou com as notícias sobre a crise alimentar.
É essa crise que nos deve fazer reflectir sobre o modo como temos olhado para a nossa agricultura. E deve fazer pensar os nossos governantes, que têm descurado os apoios a um sector que continua a ter muito potencial competitivo.
Esse potencial competitivo foi, recentemente, demonstrado por uma fileira que faz o seu caminho e que aposta na sua expansão e internacionalização: a fileira do kiwi. Mas esse potencial competitivo, devidamente sublinhado pelo Ministro da Agricultura, não caiu do céu, foi construído com base na inovação, na utilização de novas tecnologias, na definição de nichos de mercado com determinadas características, na investigação. E, por fim, na dedicação e no trabalho.
Esta fileira tem muito para dar ao país. Espero que o Governo perceba (julgo que percebe) a riqueza que a kiwicultura pode produzir, e os postos de trabalho que pode criar.
Numa altura em que se definem as candidaturas ao QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional) e respectivos apoios, quero sublinhar que a escolha política das fileiras estratégicas – como as frutas, as flores e hortícolas, o azeite e o vinho, assim como os produtos IGP (Indicação Geográfica de Proveniência); DOP (Denominação de Origem Protegida) ou os produzido em modo biológico ou tradicional – garantindo-lhes prioridade no acesso aos fundos e uma majoração entre 5 a 10% de apoio financeiro, esquece, sem razão, a fileira do leite. Porquê? É necessário uma grande transformação na actividade produtiva para incorporar no preço do leite os custos do licenciamento das explorações, do cumprimento da legislação ambiental e do bem-estar animal, bem como a racionalização da produção para minimizar os custos energéticos e dos combustíveis.
Mas a competitividade da nossa agricultura não pode fazer-se se os prazos para pagar os subsídios aos agricultores continurem a não ser cumpridos. O Estado Português deveria dar um sinal de confiança aos agricultores e seus agentes, cumprindo escrupulosamente as datas de aprovação e pagamento das diversas ajudas.
O sector vinícola é um exemplo da gravidade do não cumprimento desses prazos. As candidaturas foram aprovadas até Abril/Maio deste ano, quando, por lei, têm que estar impreterivelmente concluídos os investimentos nas vinhas até 31 de Maio de 2008. Como nesta altura não é possível fazer a implantação das vinhas e a legislação europeia impõe que os pagamentos sejam feitos em Junho/Julho de 2008, o agricultor tem de desistir do projecto ou que suportar o custo de uma garantia bancária no valor de 120% do valor da ajuda.
Face a isto, deixo uma proposta ao Ministério da Agricultura: sempre que não possa pagar em determinado ano as ajudas a que os agricultores tenham direito por insuficiência orçamental, deveria enviar um documento escrito indicando o montante em dívida e a nova data de pagamento no ano seguinte. Como esta informação não existe até à data, os agricultores e, sobretudo, os jovens agricultores, não têm possibilidades de financiarem junto da banca.

José Martino
Engenheiro Agrónomo

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