Agronomia: Considera Que a Sua Geração de Agrónomos Conseguiu Melhorar e Dar Valor Acrescentado nas Agriculturas de Portugal?
José Martino, boa noite,
Verifiquei no seu blog que tem 2
posts sobre agronomia e na minha qualidade de estudante de agronomia no ISA
(Instituto Superior de Agronomia) venho questionar o seguinte: considera que a
sua geração de agrónomos conseguiu melhorar e dar valor acrescentado nas
agriculturas de Portugal? Quais as necessidades agronómicas que identifica em
Portugal para os próximos 25 anos?
Espero pelas respostas,
Agradecida.
Saudações agronómicas
Comentários:
1.
Olhando para os desenvolvimentos agronómicos desde
julho de 1985, ano em que deixei o ISA tendo concluído a parte escolar da
licenciatura de agronomia de 5 anos (levei1 ano para realizar estágio
curricular na cultura do kiwi. Obtive o grau de licenciado em agronomia em fevereiro
de 1987) até aos dias de hoje, verifico que o desenvolvimento e crescimento das
agriculturas de Portugal teve mais a ver com a disponibilização dos fundos
financeiros públicos europeus para apoio ao investimento e rendimento dos
agricultores, das suas iniciativas e desenvolvimento de competências em função
das necessidades dos mercados, do que propriamente do planeamento estratégico e
respetivas ações, quer dos agrónomos, quer dos políticos.
2.
Foi construído um modelo inicial a partir de 1986/1987,
de ajudas financeiras europeias, o qual se manteve na mesma matriz ao longo
destes 32/33anos. Este modelo apesar de ter financiado importantes mudanças
estruturais como redução do número de explorações agrícolas e a fortíssima
redução de mão de obra nas agriculturas, assim como a passagem da agricultura
de subsistência para a agricultura de mercado e agricultura de serviço publico
(manutenção do ecossistema, biodiversidade, manutenção da paisagem rural, qualidade
da água e solo, etc.), a mudança do destino exclusivo das produções agrícolas
do mercado nacional centrando parte significativa do valor nas exportações, o
qual ano após ano, nos últimos anos, vai incrementando o respetivo valor
absoluto, não conseguiu resolver os principais estrangulamentos das agriculturas
de Portugal:
- Equilibrar ou fazer superavit na balança do complexo
agroalimentar, a qual se mantém negativa em 3800[JM1]
M€ e não há previsão de quando será ultrapassado este grave problema;
- Criar valor acrescentado e rendimento aos agricultores
para que possam ter uma vida condigna, não esquecer o elevado número de horas
de trabalho diário e semanal (muito acima das 35/40 horas de trabalho semanal
das outras atividades) o reduzido número de dias de férias (muito abaixo dos 22
dias úteis dos outros) ausência de cumprimento dos dias feriados (são mais
10-12 dias de trabalho por ano) as respetivas habitações em condições
deficientes de salubridade, condições térmicas, etc. as dificuldades em ter rendimento
disponível adequado para educar os filhos;
- Ter todo o território nacional aproveitado do ponto de
vista do potencial agrícola de produção para o mercado e na agricultura de prestação
de serviços públicos;
- Pouquíssimos jovens empresários agrícolas quer em valor
absoluto, quer em percentagem do total de agricultores;
- Fracas competências técnicas e de gestão por parte dos
agricultores e empresários agrícolas;
- Mão de obra com deficientes formação e competências
para as atividades das agriculturas;
- Explorações e parcelas de pequena dimensão;
. Abandono de terras agrícolas junto com fenómenos de
desertificação (os solos são erodidos, os solos que ficam perdem matéria, diminuem
a respetiva capacidade produtiva).
3.
A minha geração de agrónomos é fruto da sociedade
portuguesa e como tal, apesar do progresso que ajudamos a operar, não conseguimos
corporizar a transformação das agriculturas de Portugal para criar valor acrescentado
que tínhamos ambição quando deixamos a Universidade. Tal como a sociedade de
Portugal somos bons a identificar problemas, a indicar soluções casuísticas de
conversa de café, família e amigos, mas somos fracos a estudar os processos a fundo,
a dominar pormenores, a propor estratégias alargadas, quando temos propostas
estratégicas não trabalhamos para as fazer cumprir na linha do tempo, com
persistência, resiliência, foco nos resultados. Não somos capazes de corporizar
e colocar no espaço público objetivos para as agriculturas de Portugal, sejam de curto, médio e longo prazo,
capazes de serem discutidos pela opinião pública, absorvidos pelos políticos e fator
de alinhamento das ações dos players (agricultores/empresários/agrónomos/fornecedores
de fatores de produção/prestadores de serviços, etc.).
4.
Para os próximos 25 anos identifico necessidades técnicas
mais focadas nas alterações climáticas, na comunicação com o consumidor, na digitalização
e robotização das agriculturas de Portugal. Por outro lado, identifico maiores
necessidades de apoio técnico ao nível social para fazer com que os agricultores
cooperem mais, seja no campo informal, redes sociais, parcerias, etc. seja no
campo formal, organizações de produtores, associações e cooperativas.
6. Tenho a convicção e certeza absoluta que a V/ geração de técnicos terá muito melhores resultados que as anteriores.
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