Artigo Publicado na Gazeta Rural - n.º 134 - 2010.06.15

O artigo original pode ser consultado em http://www.gazetarural.com/images/edicoes/gazeta_rural_edicao_134.pdf (página 32)

Algumas reflexões sobre o ProDeR: Investimento na Agricultura

Agora que os responsáveis políticos e do Ministério da Agricultura muito falam sobre a revisão intercalar do ProDeR, nota-se que se pudessem procederiam à sua ”implosão” e construiriam um novo sistema de ajudas à agricultura. Felizmente que a União Europeia impede que tal possa acontecer e ainda bem, porque caso contrário teríamos as ajudas, sobretudo as que apoiam o investimento na agricultura portuguesa, paralisadas, pelo menos por mais dois anos, tempo necessário para divulgar as suas novas metodologias de intervenção, formar os analistas e demais intervenientes na tramitação das candidaturas, bem como para terem consciência das falhas que novo sistema geraria, etc. Esta tentação política de alterar tudo, é tanto mais real quando mudam os responsáveis políticos do Ministério da Agricultura, mesmo que sejam em remodelações do mesmo governo ou substituições de titulares por imposição eleitoral, com a consequente tomada de posse de novo governo do mesmo partido, pois a falta de estratégia e liderança política de médio longo prazo (não há uma ideia/estratégia concreta e coerente sobre os objectivos a atingir a médio prazo, a não ser a de tentar gastar os dinheiros disponibilizados pela União Europeia – mesmos estes ficam muito aquém do orçamento que Portugal tem disponível), aliadas à deficiente massa crítica e falta de afirmação de cidadania da sociedade civil (quando alguém/instituição a apresenta ideias é visto como um ataque pessoal a quem está no poder), traduzem-se na seguinte tradição: “cada responsável político que toma posse acha que irá adquirir o direito de ter um lugar na História de Portugal por fazer mudanças radicais, seja na arquitectura dos serviços do Ministério da Agricultura, quer na eliminação de medidas e na implementação de novas medidas de ruptura para substituir as anteriores, não tendo em atenção a experiência adquirida pelos Serviços do Ministério”. Estes tiques das mudanças radicais são extensíveis aos Directores Gerais e demais Responsáveis Intermédios, embora em abono da verdade afirmo que há bastantes excepções, estão mais preocupados com os seus interesses próprios de afirmação pessoal (cada Instituição que gerem é uma “quinta própria”) e sobrevivência nos cargos (tomam-se as decisões, algumas de legalidade duvidosa, que vão de encontro aos interesses dos dirigentes e caciques do partido que suporta o governo, bem como interesses particulares do poder autárquico), do que gerirem os serviços que tutelam para prestarem serviços públicos em tempo útil e de alta qualidade ao utente (No passado dia 7 de Junho de 2010, tive a oportunidade de ouvir, na Feira do Ribatejo, uma intervenção pública da Gestora do ProDeR, na qual transmitiu sua afirmação pessoal do poder que detém, o que se traduziu na afirmação do “eu” (eu faço; eu quero, etc.) em detrimento do “nós” (nunca foi utilizado na sua intervenção), a afirmação de representante do grupo que lidera, a qual seria mais prestigiante e motivadora para a vasta equipa do ProDeR, a qual tem de trabalhar em condições muito stressantes e de alta pressão constante).

A minha experiência como líder de uma equipa projectista e gestora de processos burocráticos em nome do utilizador, diz-me que todo o tipo de processos sob tutela do Ministério da Agricultura deveriam ser analisados em todos os seus pormenores e melhorados os seus estrangulamentos e pontos fracos, deixando funcionar de forma normal todos os aspectos que sejam positivos. Sempre que há mudanças radicais sem atenção pelo passado histórico, abrem-se rupturas que levam anos a estabilizar e o utilizador acaba por ser a principal vítima da mudança, seguindo-se os funcionários do Ministério da Agricultura, sobretudo aqueles que estão no contacto directo com os agricultores e os seus agentes. Há um longo período de tempo para que o processo estabilize e a informação seja clara para todos os agentes que intervêm no processo.

Na minha opinião, é mais importante a transparência dos processos burocráticos do que a sua simplificação. A simplificação deve ser feita até entroncar no cumprimento da legislação nacional e europeia, pois quando tal não acontece acarreta no futuro, para o proponente, maiores problemas que um processo mais complexo. A transparência traduz-se em que cada interessado possa obter, antes da apresentação do seu processo no Ministério da Agricultura, toda a informação sobre os seus trâmites (prazos legais de tramitação, os diversos passos do processo, vantagens e inconvenientes da sua apresentação, documentos necessários a apresentar ao longo do processo, regras dos controlos e auditorias, etc.). A transparência exige que na programação da arquitectura das ajudas se consigam prever todos os pormenores, problemas e implicações permanentes que a sua tramitação irá levantar ao longo de todas as fases, da recolha da informação para a tomada de decisão de candidatura às ajudas, passando pela apresentação da candidatura e pedidos de pagamento, até aos controlos e auditorias. Mais, a transparência acarreta a definição do período de tempo realista para tramitação de cada uma das fases da candidatura, pois tem como pilar o cumprimento dos prazos legais, caso não seja decidido em tempo útil haverá lugar a deferimento tácito (aprovação, pagamento, queda das eventuais infracções em sede de controlo e auditoria, etc.). Ao longo do período temporal em que cada medida/acção vigora tem que existir uma monitorização contínua, controlando todos os pormenores que não funcionam bem, propondo e implementando soluções em tempo útil para se aperfeiçoar o processo.

Esta clareza na tramitação obriga ao cumprimento dos prazos legais na análise, pedido de pagamento, etc. (no caso dos prazos em vigor não serem compatíveis com a realidade devem ser alterados, sobretudo aumentados) assim como, levará à melhoria de comunicação dentro da equipa que tramita o ProDeR. Proponho a integração da tramitação das candidaturas entre o ProDeR e as Direcções Regionais de Agricultura e Pescas (DRAP), ou seja, as divisões e/ ou direcções de serviços das DRAP deveriam depender do ponto de vista funcional da Autoridade de Gestão do ProDeR (quando faltarem meios em determinada DRAP, através das verbas da assistência técnica do ProDeR, podem ser rapidamente solucionadas essas limitações). A adaptação deveria passar pela existência no ProDeR de um gestor responsável para cada Acção, o qual fosse o interlocutor directo dos responsáveis e técnicos das DRAP, bem como das empresas projectistas. Neste ponto, as coisas funcionam tal mal que há problemas que nenhuma das Entidades quer assumir a solução porque há falta de acesso para se dialogar com o ProDeR, como exemplo, um Director de Serviços de uma DRAP dizia-me recentemente que para resolver os problemas de pormenores que se lhe colocam todos os dias para ter as análises e contratações dos projectos em dia, só o consegue através da via informal pela amizade que tem com um responsável do ProDeR que lhe disponibilizou o acesso através do telemóvel, pois formalmente não consegue que alguém do ProDeR lhe atenda o telefone.

De âmbito, mais programático diria que o ProDer consubstancia a materialização de princípios políticos que me parecem basilares para ir de encontro às especificidades das agriculturas portuguesas, nomeadamente, de acordo com o n.º 1 do artigo 14.º da Portaria 289-A/2008,de 11 de Abril, a possibilidade da abertura de concursos por: a) Objectivos e prioridades visadas; b) Tipologia de intervenções a apoiar, c) Área geográfica elegível; d) Dotação orçamental a atribuir; e) Fileiras elegiveis; F) forma e limites de apoio. Em síntese, isto significa que se o Governo quiser pode abrir um concurso (período para recepção de candidaturas electrónicas para o investimento na agricultura) que seja exclusivo para apoiar as actividades que politicamente entenda como relevantes, por exemplo, para a olivicultura na Região Centro e dentro desta, pode tornar elegível como tipologia, limitando os investimentos aos que contemplem a implantação de variedades regionais.

Em síntese, a revisão intercalar do ProDeR é uma oportunidade para melhorar os seus pormenores mais negativos que desaguam algumas vezes em processos kafkianos que atrasam as contratações e pagamentos das ajudas. Deve ser um período de análise e reflexão do que está a funcionar mal na sua gestão no que diz respeito ao interface: Promotor, ProDeR, DRAP e IFAP (esta intervenção de múltiplas Entidades, sem subordinação hierárquica, era apontada desde o lançamento do ProDeR, como o sua principal limitação).

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