KIWI EM PORTUGAL, UM CAMINHO DE 50 ANOS
Artigo de opinião da minha autoria publicado na revista Voz do Campo, n.º 267 - FEV 23 no âmbito Da Grande Reportagem com os principais agentes da fileira do kiwi
A actinídea, planta que produz o kiwi, cumpre este ano 50 anos em Portugal, a
1.ª plantação foi realizada pelo Dr. Ponciano Serrano, em Vila Nova de Gaia, no
ano de 1973.
Esta cultura da actinídea passou por um período
pioneiro nas décadas de 70 e 80 do século passado, a fase de euforia denominada
de “árvore das patacas”. Plantou-se por quase todo o país, em muitos casos em
solos e climas não adequados à cultura (solos encharcados, geadas primaveris em
abril e outonais em outubro ou início de novembro, com falta de água para rega
durante o verão, etc.). Fraco conhecimento técnico, mercados incipientes e
inexperientes quanto à comercialização do kiwi e ao seu consumo, um produto
“quase de luxo” pelo seu elevado preço.
Em 1992 houve uma crise de mercado com os
preços ao kiwicultor a descerem dos 400$-500$ por quilo (2-2,5€/kg) para preços
médios de 60$ por quilo (0,30€/kg).
Esta crise fez uma séria separação entre os produtores que tinham e não tinham,
condições edafoclimáticas para a cultura ou, entre kiwicultores mais
disciplinados, rigorosos e resilientes em contrapartida daqueles que não tinham
essas qualidades empresariais ou eram simplesmente “especuladores” que queriam
ganhar muito dinheiro com pouco esforço, houve o desaparecimento rápido de um
elevado número de produtores. A década de 90 do século XX foi uma fase de
desencanto, desmotivação e manutenção das plantações e agricultores que
resistiram ao teste da crise de mercado indicada acima.
No inicio do século XXI deu-se uma subida de
preço de remuneração aos kiwicultores na ordem dos 0,25€ por quilo devido à
intervenção da empresa espanhola, Kiwiatlântico, porque tinham falta de frutos
do país e o mercado espanhol valoriza o seu produto nacional (o kiwi português
tem perfil de qualidade igual ao espanhol). Por sua vez, os entrepostos
portugueses foram obrigados a exportar para Espanha para serem competitivos nos
preços ao produtor.
Entre 2000 e 2004 houve um programa de implantação de 130 hectares de kiwis na
Bairrada, parceria da Kiwicoop com a Espaço Visual e Entidades Públicas, ação
esta que iniciou lentamente o processo de incremente das superfícies de novas
plantações.
Em 2004 o aparecimento da APK – Associação Portuguesa de Kiwicultores, entidade
que congregou produtores e técnicos, assim como, mais tarde, entrepostos,
trouxe uma incorporação maciça de boas práticas culturais, quer nacionais, quer
estrangeiras, as quais, muito contribuíram para incremento da produtividade e
qualidade das produções, melhoria dos resultados económicos das explorações
agrícolas. O Plano Estratégico da Fileira que a APK elaborou em 2006, alinhou
os respetivos players e fez com que a rentabilidade crescesse de forma
paulatina até à atualidade.
Em 2010/2011 a crise e o pânico provocados pelo
aparecimento da doença PSA, bactéria Pseudomonas
syringae pv. Actinidiae, sendo o seu maior prejuízo o apodrecimento da madeira
dos ramos do ano anterior, unidades de produção, na primavera, aquando do
abrolhamento (fim de março, inícios de abril) ou nos dois meses seguintes. Este
susto internacional, causado pela infeção bacteriana, levou a uma paragem no
ritmo elevado de novas plantações e fez com que o preço á produção se
mantivesse estável e elevado ao longo dessa década.
Passados meia dúzia de anos, a PSA ficou controlada pelas as técnicas culturais
na altura, as quais, ainda se mantêm atuais, o que motivou novo incremento nas
plantações.
Os últimos anos de produção, mesmos com recordes nacionais na produção total
absoluta, mantiveram-se os preços elevados do fruto, pela redução da oferta
internacional europeia devido aos problemas em 25 % da superfície de plantações
italianas (total, acima dos 18 000 hectares) devido a uma doença
denominada “moria” (significa, morte por uma doença infecciosa) os investigadores
ainda não conseguiram encontrar a causa.
As produções dos últimos anos em Portugal estão acima das
40 000 toneladas, prevendo-se que continuem a subir como resultado da
entrada em produção de novas plantações, estas além de cobrirem o défice expectável
na quantidade das plantações muito antigas, com mais de 30 anos, serão
responsáveis pelo incremento produtivo acima de 5% ao ano nos próximos anos.
Há um predomínio da produção de kiwis verdes em Portugal porque
são os menos sensíveis à PSA, embora existam 2 a 3 mil toneladas de produção
nacional de kiwis amarelos. As plantações de kiwis amarelos são mais caras e de
maior risco, porque exigem a cobertura com redes ou plástico para diminuir a
suscetibilidade à bacteriose. Os kiwis amarelos, só podem ser produzidos sob
clube, o produtor obtém licença para as plantas se assinar contrato de venda
exclusiva de fruto com uma única organização comercial, têm produtividades mais
elevadas que os verdes, têm tendência a terem calibres menores, frutos com peso
médio mais baixo, maior preço por quilo ao produtor e ao consumidor, permite
chegar a outro segmento de público que não gosta de kiwis ácidos
Há algumas explorações em estufa com kiwis vermelhos,
investimentos muito elevados por hectare, com resultados preliminares,
primeiros anos de produção, com bons indicadores de mercado.
A fileira do kiwi é muito organizada, muito profissional e acompanha muito de
perto a evolução técnica de produção internacional e está muito ligada à
exportação dos frutos, sobretudo para o mercado espanhol que tem garantido
preços elevados.
No mercado interno está muito dependente da distribuição organizada, esta
pratica margens brutas muito altas, quem consome o kiwi fá-lo por recomendação
médica ou de nutricionista para regularizar de forma natural o transito
intestinal, o que encarece, na minha opinião, o preço do kiwi ao consumidor,
retrai a quantidade consumida .
Quanto ao futuro, é altamente provável que existam alterações de
mercado, há previsão que a Grécia ofereça mais 50 000 toneladas por ano,
em Espanha, a tecnologia de redes e de incremento de humidade atmosférica,
estão a permitir plantações em locais que há 10 anos atrás ninguém acreditaria
que houvesse produção por deficiências de clima.
A pressão atual de incremento de custo de fatores de produção e mão de obra,
que se irão manter nos próximos anos, junto com o incremento da oferta dos
kiwis, levarão ao abaixamento de preços dos frutos no mercado, ou a sua
manutenção em valor, preço, através da diferenciação com frutos mais saborosos,
com prolongamento da conservação frigorífica sem abaixamento de dureza. A
melhoria da qualidade irá obrigar ao controlo da produtividade, ao uso de
práticas culturais ajustadas a este objetivo.
Tenho a certeza que a fileira do kiwi estará, uma vez mais, à altura destes
enormes desafios futuros como demonstrou pelo caminho percorrido desde que
existem actinídeas em Portugal, há precisamente meio século!
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