Carta aberta a Paulo Portas


Há dias, ouvi V. Exª dizer aos jornalistas que “só falava de agricultura”. Intuí que tentou escapar a perguntas incómodas, mas espero estar enganado. V. Exª é uma espécie de paladino dos agricultores, pelo que não acredito que utilize a agricultura como escapatória para se furtar a falar de temas mais “quentes” mas certamente menos importantes para a economia.
Não subscrevo a crítica que alguns anos atrás um ex-ministro lhe fez de que “só falava de agricultura em campanha eleitoral”. A forma como, segundo veio a público, se bateu para o reforço de 500 milhões de euros de fundos comunitários para o desenvolvimento rural leva-me a crer que as suas palavras não são levadas pelo vento.
Contudo, o sector agrícola nacional necessita de opções políticas claras e que assumam rupturas com o “status quo”. Registo como positivo que a actual ministra da Agricultura evitou a devolução de dinheiro a Bruxelas e que tem junto das Finanças assumido o pagamento atempado das ajudas públicas ao investimento.
Mas é preciso inverter uma lógica que se baseia em dar dinheiro a todos. Temos de identificar as pessoas mais competentes ao nível do empreendedorismo e gestão, sobretudo aquelas que o são no seio dos agricultores, e privilegiar estes agentes para terem acesso às ajudas públicas ao investimento, produzindo de forma eficiente e eficaz, promovendo o incremento da dimensão por exploração ou agro indústria e caminhando para as economias de escala.
Temos um PIB agrícola abaixo dos 4%. Para alcançar os 10%, meta que julgo exequível nos próximos anos, é preciso tirar partido integral da superfície irrigável no Alqueva e explorar devidamente os demais regadios existentes ao longo do país. Por outro lado, é imperativo da independência económica de Portugal colocar a agricultura a gerar valor acrescentado.
A agricultura tem de ser olhada como um negócio e não como um hóbi ou mera actividade de lazer. Os empresários agrícolas, com perfil e vocação para assumir riscos, adquirir competências, dar valor acrescentado ao “made in” Portugal para entrar em novos mercados de exportação, na Ásia, na América Latina, etc,, devem ser apoiados e financiados.
O sistema de ajudas públicas ao investimento tem de ser mais eficaz. Tem de saber distinguir a “agricultura de mercado” da “agricultura de subsistência”, que não deve ser abandonada pelo Estado. Uma política agrícola de “nova geração” deve obedecer a uma estratégia de longo prazo, no mínimo duas legislaturas, com evidentes vantagens para a nossa competitividade agro-industrial.
Recentemente V. Exª disse que o Alqueva é a Auto-Europa da agricultura. Para que não fiquemos apenas pelo “soundbyte”, permita-me elencar algumas propostas para uma agricultura mais competitiva, agora que vai arrancar o PDR (Plano de Desenvolvimento Rural) 2014/2020: Valorizar o perfil empresarial e competência profissional do agricultor, no acesso à ajuda pública ao investimento; Privilegiar as economias de escala dos projectos candidatos aos apoios; Privilegiar o apoio a projectos que garantem a fixação do agregado familiar em zonas de desertificação; Cumprimento dos prazos de pagamento; Criação de um tipo “crédito habitação”, para apoiar a reestruturação fundiária das explorações.

artigo de opinião publicado na edição de hoje (26 de maio de 2014) do Jornal de Notícias.

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