10º aniversário da Gazeta Rural

O texto que aqui partilho com os meus amigos foi publicado hoje na edição do 10º aniversário da prestigiada revista "Gazeta Rural", para a qual o seu Director, José Luis Araújo, teve a amabilidade de me convidar.


O desafio dos próximos 10 anos
José Martino (empresário e consultor agrícola)
Josemartino.blogspot.pt
A Gazeta Rural, uma publicação de prestígio sobre questões da agricultura portuguesa, pede-me uma análise sobre o que foi a agricultura portuguesa nos últimos 10 anos e aquilo que estimo que seja nos próximos 10.
É uma tarefa de risco que assumo com todo o prazer. A primeira parte do desafio é relativamente fácil. Basta fazer uma pequena investigação nos relatórios elaborados pelo INE – Instituto Nacional de Estatística e encontra-se facilmente o cenário daquilo que foi a última década agrícola em Portugal.
A percentagem dos agricultores portugueses sem qualquer instrução diminuiu significativamente (47% para 29%), a dimensão média das explorações aumentou, de 6,7 ha para 11,4 ha, os agricultores cujo rendimento depende exclusivamente da exploração agrícola também aumentou, de 7% para 11%.
Tudo isto são (foram) boas notícias, mas será que a realidade agrícola portuguesa mudou assim tanto nos últimos 10 anos? A resposta a esta pergunta é essencial para preparar a próxima década da agricultura nacional.
E a resposta é: sim, mudou. Mas mudou mais a forma do que o conteúdo. Isto é, mudou mais a percepção que as pessoas, a sociedade e os “media” tinham da agricultura, do que a realidade mais profunda do sector, ao nível económico e social.
Hoje, a agricultura está na moda. Uns dizem que isso acontece por causa da crise. Outros por causa do interesse que subitamente a comunicação social começou a dedicar ao sector. Uma causa e outra estão umbilicalmente ligadas.
Muitos jovens agricultores olharam para a agricultura como a fonte de todas as soluções: da perda de emprego à baixa de rendimentos. Os nossos políticos, por seu lado, anunciaram a agricultura como o pilar fundamental da nossa economia.
A questão central é que os problemas de fundo mantêm-se. Um exemplo: há dias, milhares de jovens agricultores foram confrontados com a suspensão das candidaturas ao ProDer, que está no seu último ano de execução.
A medida apanhou todos de surpresa, até porque governantes com responsabilidade no sector tinham afirmado o contrário. Este é um paradigma que tem de ser mudado. A agricultura e os agricultores não podem viver na incerteza. É por isso que tem de ser definido, pelos partidos de poder, um quadro estável de duas legislaturas (8 anos) sobre como deve funcionar a nossa agricultura.
Deixo aqui o meu contributo para a agricultura portuguesa dos próximos 10 anos. Temos de implementar um sistema de ajudas ao investimento que privilegie quem trate a agricultura como um negócio, criando valor e emprego, e não como um mero hobby.
Essa diferenciação é crucial. Ela permitirá fazer uma triagem desses apoios, com benefícios para quem faça agricultura de mercado, para quem invista na aquisição de competências e conhecimento.
Esta deve ser uma alteração fundamental dos próximos 10 anos. Os actores políticos devem reflectir sobre a necessidade de apoiar (estamos a falar de recursos públicos, limitados e de todos, pelo que a sua gestão rigorosa é obrigatória) quem quer assumir o seu perfil e vocação de agricultor, constituindo a sua própria empresa, com capitais próprios e fundo de maneiro 
Esse é um sinal incontornável sobre o novo modelo agrícola que é preciso construir para os próximos 10 anos. Um modelo que terá de estimular o arranque efectivo da Bolsa de Terras, através de uma maior participação empresarial; o reforço do sector associativo, mais forte e organizado; um Ministério da Agricultura que seja fonte dos melhores quadros técnicos e que possa ir ao mercado contratá-los.
Uma boa parte destas premissas deve ser assumida e plasmada em propostas pelo GPP (Gabinete de Planeamento e Políticas), caracterizando o que existe e lançando as bases de um novo modelo, com objectivos concretos.
Temos fazer com que os apoios públicos ao investimento sejam efectivamente reproduzidos na agricultura nacional. Isso só se consegue com uma alteração de um modelo baseado numa ideia sociológica para um modelo de mercado. 
Estou convencido de que só assim poderemos ambicionar obter um PIB agrícola que atinja os 10% do PIB nacional. Esse é o desafio que se coloca nos próximos 10 anos a todos os agentes que trabalham no sector agrícola. Espero dar o meu contributo para atingir esse desiderato.

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