A vez da economia real
A vez da economia real
José Martino
Empresário e Consultor Agrícola
A crise do BES veio pôr a nu uma verdade gritada a plenos pulmões há muitos anos: a economia real é feita por pessoas como eu e o leitor. Pessoas que sabem quanto custa uma bica, um bilhete de metro, a bandeirada de táxi ou quanto custa montar uma empresa, os dias do mês para pagar às Finanças, muitas vezes pagamentos por conta de IVA e IRC, à Segurança Social e salários.
Vivo da e para a agricultura há tempo demasiado para saber bem o que é a economia real. Vejo todos os dias gente como o leitor a mexer na terra, a semear, a colher o fruto e a vendê-lo.
Vejo há muito tempo gente a investir com o seu dinheiro e com o dinheiro dos bancos e dos fundos comunitários não na compra de acções ou de outros produtos financeiros, mas na compra de terra, na compra de maquinaria e factores de produção, na aquisição de mais formação e conhecimento, na contratação de mais funcionários.
Assisto com gosto e com um brilhozinho nos olhos a toda esta (r)evolução na agricultura portuguesa, que escapa muitas vezes ao mainstream, ocupado com as novelas da especulação financeira.
Enquanto andamos distraídos, a nossa agricultura não pára. Os nossos criadores de negócios agrícolas procuram novas soluções para os seus projectos, sempre com o fim último de gerar mais valor acrescentado, garantir mais riqueza e criar mais postos de trabalho.
Estou convencido que a imaginação e a genialidade dos nossos produtores agrícolas vai permitir que a agricultura do futuro não esteja limitada a questões de sazonalidade, mas será possível produzir tudo, todo o tempo, em todo o lado. Sem estar dependente de questões como o clima ou o solo.
Recentemente, a economia real da nossa agricultura deu mais um exemplo concreto de como potenciar o negócio. Enquanto os holofotes mediáticos estavam virados para a economia financeira, a tal que não cria valor acrescentado mas destrói valor, o empresário Lino Santo, da Primores do Oeste, uma empresa de hortícolas, garantiu, através de uma parceria com a Galp Energia, a possibilidade de produzir durante todo o ano através do aquecimento das suas estufas.
Este empresário agrícola vai investir mais 25 milhões de euros este ano, vai criar mais valor acrescentado, exportar mais, importar riqueza para o nosso país, contratar mais pessoas. A petrolífera vai libertar menos dióxido de carbono para o ar e assim proteger e defender mais o ambiente.
Numa altura difícil para muita gente em Portugal, lembro-me amiudadamente da célebre frase de John Fitzgerald Kennedy, o icónico presidente democrata norte-americano: "Não perguntes o que a América pode fazer por ti; pergunta o que podes fazer pela América."
Certamente há outros lugares em Portugal em que outros projectos deste tipo se podem implementar e multiplicar. Há gente que à hora a que escrevo está a fazer muito pelo seu e nosso país, pelos que têm e pelos que não têm emprego. Gente que a torrente de notícias brutais não paralisa nem faz recuar. Gente que continua a arriscar, a projectar, a inovar, a investir, a contratar. É em gente deste calibre e desta estirpe que temos de pôr os olhos.
Da comunicação social aos comentadores e analistas, aos poderes públicos e aos homens de Estado, se é que ainda os há por aqui. Já o disse e escrevi publicamente: gostava de ver o reconhecimento público por estes criadores de negócios, de trabalho e riqueza, ao ponto de merecerem ser agraciados com os títulos honoríficos do Dia de Portugal. E não percebo porque é que não há nenhuma personalidade da economia real com assento no Conselho de Estado. A famosa Reforma do Estado também tem de passar por aqui. A economia real agradece!
Artigo de opinião publicado hoje no jornal i
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